Hoje este post tem um caráter acima de tudo cidadão ... algumas pessoas mais próximas sabem da minha escolha por Psicologia, da minha itinerância no Mestrado na interface com a Educação ... a motivação disso tudo foi o trabalho na área de necessidades educacionais especiais ... pois, que neste sentido faço parte da rede de apoio às mais diversas situações inclusive àquelas referente ao preconceito.
Numa contemporaneidade que traz como marca a democratização da informação parece-me ainda que muitos desejam continuar na "idade média intelectual" quando agem de forma pouco educada extremamente excludente nos seus comentários jocosos e fora de tom.
Abaixo compartilho a Nota de Desagravo de um pai especial, de uma menina linda e doce como seu nome (MEL), que não se deixou abater pelo comentário de um radialista baiano.
Aos fuxiqueiros que sempre passam por aqui com suas agulhas, linhas e tecidos coloridos que possamos ampliar este fuxico numa colcha de matizes mais coloridos e menos preconceituosos.
#diganãoaopreconceito
NOTA DE DESAGRAVO
Foi com muita indignação que eu
ouvi o Sr. Mário Kertész, no jornal da manhã na rádio metrópole no último dia
02/08/2013, tecendo comentário infeliz que atenta contra a dignidade de pessoas
com necessidades especiais. Em brincadeira com o radialista Abraão Brito, o
empresário perguntou se sua filha já estava namorando. Em resposta, Brito
disse-lhe que não, o que instigou o âncora da rádio Metrópole a fazer uma
abjeta piadinha, perguntando se a filha do colega tinha problemas, se era doente,
se frequentava a APAE. O que leva um sujeito, nos dias atuais, a fazer
um comentário desse tipo? Em muitos casos, a ignorância ou o preconceito são os
motores de comentários dessa natureza. Como se trata de um comunicador e de uma
pessoa com um nível cultural e social privilegiado, não creio que o comentário
tenha sido produto do não-conhecimento da realidade das pessoas deficientes ou
que frequentam a APAE.
Ao insinuar, em tom jocoso, que
se a filha de Abraão Brito não namorava era pelo fato de frequentar a APAE, o
Sr. Mário faz uma brincadeira de absoluto mau gosto e desmerece todas as
conquistas dessas pessoas com alguma deficiência mental ou que, de algum modo,
frequentam ou convivem com essa Associação. O infeliz comentário foi, ao mesmo
tempo, um atentado contra as pessoas com deficiências intelectuais e contra
essa prestigiada Associação. Não acredito que o Sr. Mário desconheça essa
realidade, prefiro crer que ele tenha tido um lapso de amnésia. Acho que ele,
como um bom comunicador, deva saber que a Associação de Pais e Amigos dos
Excepcionais (APAE) nasceu em 1954, no Rio de Janeiro e caracteriza-se por ser
uma organização social, cujo objetivo principal é promover a atenção integral à
pessoa com deficiência, prioritariamente aquela com deficiência intelectual e
múltipla. Não recebi nenhuma procuração para defender tal entidade em relação a
esse episódio, mas é informação pública e notária que a Rede APAE destaca-se
por seu pioneirismo e capilaridade, estando presente, atualmente, em mais de 2
mil municípios em todo o território nacional. Uma pesquisa realizada pelo
Instituto Qualibest em 2006, mostrou que a APAE é conhecida por 87% dos
entrevistados e tida como confiável por 93% deles. São resultados expressivos e
que refletem o trabalho e as conquistas do Movimento Apaeano na luta pelos
direitos das pessoas com deficiência.
Quanto às pessoas com
deficiências intelectuais, Sr. Mário Kertész está precisando rever seus
conceitos para enxergar o quanto esses seres humanos são dignos e conseguem,
cada vez mais, inserir-se na sociedade e levar uma vida absolutamente “normal”,
firmando relações afetivas, namorando, casando, construindo famílias, etc. É
cediço os conhecimentos eruditos e o bom nível cultural que o empresário Mário
Kertész, em seus programas da rádio, demostra ter. Conhece muitos países e
culturas diferentes, lê variadas literaturas e assiste a uma infinidade de
filmes. Entretanto, uma pessoa tão culta e erudita e que é formadora de
opinião, com uma relevante audiência, não pode fazer um comentário tão
inadequado, preconceituoso e ofensivo. Já que ele assiste a tantas películas,
deixo uma dica interessante para ele assistir ao multipremiado filme “Colegas”.
Certamente, ele vai enxergar um lado interessante e vai ver que os
“frequentadores da APAE” levam uma vida como qualquer outra pessoa, apenas têm
características próprias, que talvez até as tornem seres mais iluminados. Os
três protagonistas do filme possuem a síndrome de down, dois deles, inclusive,
são casados na vida real. Fora isso,
um pouquinho mais de informação vai mostrar que os downianos estão cada dia
mais surpreendendo parte da sociedade que ainda enxerga esses lindos seres
humanos com o arquétipo preconceituoso dos “mongoloides”. Já temos inúmeros
exemplos de sucesso dessas pessoas portadoras de um cromossomo a mais: tantos
escritores, universitários, professores, artistas e até mesmo uma vereadora na
Espanha. São tantas e tantas conquistas que se torna anacrônica, e até mesmo
vergonhosa, a existência de comentários preconceituosos acerca desses
“frequentadores da APAE”. Enfim, seria interessante que o Sr. Mário Kertész
revisse seus (pré) conceitos e até mesmo se retratasse perante a sociedade
baiana. Embora a população de Salvador já o tenha dado um sonoro não à sua
pretensão de administrar a cidade, grande parte dessa mesma população, aqui me
incluindo, é ouvinte de sua rádio, que, de fato, tem uma interessante grade de
programas e presta bons serviços à sociedade. Por isso, ele precisa ter mais
cuidado e responsabilidade em seus comentários, principalmente quando os faça
com grande carga de conceitos equivocados e não condizentes com a realidade. Em
arremate, registro aqui meus votos para que o Sr. Mário tenha a oportunidade de
conviver mais de perto com esses “frequentadores da APAE”. Quem sabe ele ainda
não venha a ter um netinho(a) com a síndrome de down? E não estou aqui a lhe
querer mal em retaliação ao desprezível comentário, tampouco lhe desejando
infortúnios. Muito pelo contrário! Estou lhe desejando uma fantástica experiência
de vida, como a que eu estou tendo, desde quando tive a oportunidade de ser pai
de uma doce e encantadora menina com a síndrome de down.
Luciano Chaves de Farias (pai da
downiana Mel, com 1 ano e 4 meses)
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