O CORPO QUE A
PSICANÁLISE LEGITIMA À EDUCAÇÃO
UMA PRIMEIRA PINCELADA
Inicio
estas letras pensando como a pintura La
magie noire (1945) do artista belga René François Ghislain Magritte
(1898- 1967) de fato pode - dentre outras interpretações – representar a
relação entre corpo, psicanálise e educação. Artista, que tem como foco de
trabalho o uso de imagens insólitas,
nesta obra específicamente me faz metaforizar o corpo na representação do nu sendo
isso a validação dada pela psicanálise à educação. Explico melhor: por questões
históricas a escola esteve sempre ligada à igreja e aos seus dogmas, por conta
disso, jamais permitia pensar o corpo despido de vestes. Por considerar o
humano ‘a imagem e semelhança de Deus’ a escola tomando por base os desígnos da
igreja propaga entre os alunos-fiéis a
necessidade da contenção do corpo. Este corpo que trago na imagem sedutor e nu,
neste sentido, apesar de ser visto como um aliado de satanás - pois, quando os
prazeres carnais desafiam as normas estabelecidas pela escola é exorcizado como
que estivesse entregue aos domínios do mal - é a minha metáfora referindo a possibilidade que Psicanálise propõe de
sair deste lugar proíbido e maléfico passando o corpo nu a ocupar um lugar
legitimado.
Quando
refiro sobre a legitimação do corpo pela psicanálise à educação, penso ainda
que as nuvens que perpasam este corpo representado por Magritte podem tomar
diversas formas a depender do ponto de vista e podem representar com isso as
diversas possibilidades de uso do corpo à favor dos processos educacionais especialmente dos processos referentes a
díade ensino-aprendizagem.
Nas
últimas décadas vemos avançar discussões sobre o corpo. As mesmas tem sido alvo
de debates e produções nos campos das ciências humanas e da filosofia,
entretanto, no campo da educação o tema ainda mostra certa timidez de
abordagem. Se pensarmos sobre os primórdios da profissão docente veremos que
esta não nasce do professor como acontece em outras profissões liberais que se
constituem endogenamente e lutam para se individualizar. Ela – a docência –
nasce da igreja e se configura como ofício tendo na ideia de sacerdócio e
aptidão o seu cerne assim, sendo considerado um movimento exógeno. Neste
sentido, o olhar religioso sobre educação não permitia vislumbrar o corpo na
possibilidade do mesmo ser usado a favor da aprendizagem. Ao contrário o corpo,
através dos castigos físicos[1],
era usado como punição a não aprendizagem ou ao possível descumprimento das
regras internas da sala de aula. Amarra-se
o corpo deixando livre apenas o cérebro considerando que desta maneira se daria
de fato o processo de aprendizagem.
Somente
no século XIX a escola normal vai se constituir acontecendo aí o início da
formalização da formação passando de certa maneira, a escola, de leiga a laica
sendo convocada a afastar-se das premissas religiosas acedendo a lugar
imparcial, neste sentido ficando inclusive sua organização a cargo do Estado, aí
se instaurando o lugar social da escola. Ou seja, é na modernidade que nascerá
no seio do movimento social o modelo de escola o qual trará à criança
possibilidade outra que apenas a de “coexistência cotidiana com o mundo dos
adultos” (NÓVOA, 1991, p. 110) transpondo a aprendizagem de condutas e de
saberes da família e das comunidades a este novo modelo de escola que passa a
tomar o corpo sob outra dimensão. Este passa a ser visto como importante ao
processo de aprendizagem já que os construtos da psicomotricidade surgem para
colaborar com esta articulação corpo-aprendizagem de maneira que agora há um
maior entendimento do sujeito na articulação entre: aprendizagem, desejo,
cognição e corpo.
A escola
do lugar de instituição social[2]
passa a ter uma relação dialética com a sociedade. Este “caminho entre as
ideias”[3]
permite que pensemos sobre a mesma como espaço de transformação ainda que traga
marcas da cultura do sistema dominante capitalista. Os avanços da ciência
fizeram com que o conhecimento se torne fragmentado, paralelo a isso
produziu-se também desconhecimento do humano da vida e das relações e, o
reflexo disso na educação perpassa pelos sistemas competitivos e pelos saberes
desconectados. Percebemos que apesar desta nova perspectiva que se coloca a
relação do professor com o processo de aprendizagem do seu aluno ainda é algo
permeado de inseguranças que muitas vezes refletem a sua formação.
Conforme
nos traz Nóvoa (2002, p.33) “a planificação baseada em diagnósticos cada vez
mais sofisticados das situações educativas assumiu-se como ponto nodal da ação
pedagógica”. De modo geral a formação do professor tornou-se um campo cheio de
desafios para que possa se adequar às exigências dos novos contextos
contemporâneos tais quais: a globalização das economias, as novas tecnologias,
os novos modos virtuais de comunicação, dentre outros e o corpo é uma temática
pouco vista nos currículos, nas atividades e nas disciplinas da pedagogia.
A PINTURA DA TELA: A PSICANÁLISE
LEGITIMA O CORPO À EDUCAÇÃO
“Nascendo
na chamada era vitoriana, num suposto berço repressivo, a Psicanálise surge
diluindo as fronteiras entre o corpo e a alma, entre o normal e o patológico,
entre o esporádico e o cotidiano, entre a inocência e a perversão, tornando-se,
dessa forma, um bebê escandaloso”
Maria
Joana de Brito D’Elboux Couto
De modo geral podemos
considerar que o corpo e os gestos são fundamentais para a formação global do
ser humano. Desde que nasce, podemos perceber que a criança usa a linguagem
corporal para conhecer a si mesma, para relacionar-se com seus pais, para
movimentar-se e descobrir o mundo[4] o movimento constitui desta maneira a sua expressão
global de necessidades. Essas descobertas feitas com o corpo deixam
marcas, são aprendizados incorporados e eficazes[5],
que lhe dão acesso a ordem da cultura, além de auxiliar na formação do mundo
simbólico deste sujeito.
Sobre
o simbólico esclareço que o termo foi utilizado em 1936 pelo Psicanalista
Jacques Lacan quando tecia comentários sobre o estádio do espelho[6].
Tomado de empréstimo do psicólogo Henri Wallon (1879-1962), Lacan conceituou de
fato ‘simbólico’ em 1953 quando escreveu sobre a trilogia do RSI[7]
(Real, Simbólico e Imaginário). Nesta categoria Lacan introduziu uma
reformulação baseada em Leví-Strauss de modo que o inconsciente freudiano foi
redimensionado “como lugar de uma mediação comparável à do significante no
registro da língua” (ROUDINESCO, 1998, p. 714).
Assim,
simbólico passa a ser utilizado
para
designar um sistema de representação baseado na linguagem, isto é, em signos e
significações que determinam o sujeito à sua revelia, permitindo-lhe referir-se
a ele, consciente e inconscientemente, ao exercer sua faculdade de simbolização.
(ROUDINESCO, 1998, p. 714)
Para que
o sujeito seja constituído de modo efetivo e psiquicamente saudável, neste
sentido sob o prisma da psicanálise que aqui tomo como balizador, é necessário
que a sua constituição se dê dentro da base triangular. A triangulação edipiana
formada por pai – mãe – criança inaugura um mundo simbólico sustentado pela lei
exercida pela função paterna, o pai fazendo parte do mito necessário à ordem
(Lei) e, essa suposição torna-se universal e paira no imaginário coletivo.
A esse
respeito, Dor (1992, p.17) trazendo as ideias de Lacan defende a importância do
pai, não enquanto ser encarnado, mas
como ‘entidade essencialmente simbólica’
que ordena uma função. Nesse sentido, a questão do pai é postulada sob a égide
da triangulação edipiana como unidade fundadora da família. Com isso, busca-se
marcar a importância das funções parentais e do seu papel simbólico enquanto um
sistema ordenador do sujeito e suporte da estruturação psíquica da criança,
permitindo-lhe iniciar-se em uma existência significante.
Assim, a
família não se constitui apenas de homem, mulher e filhos, ela é antes
construção psíquica, onde cada membro tem sua função e seu lugar constituindo-se
num verdadeiro sistema cuja marca desempenha papel fundamental no nascimento do
sujeito, em sua inscrição subjetiva. Vale salientar que apesar de Lacan tratar
da teoria ele não exclui o corpo no seu esquema topológico nem reduz o fenômeno
analítico apenas ao simbólico, ou seja ele não reduz o sujeito apenas a discurso.
Importante
de pontuar com isso que cabe a mãe sustentar o pai através do seu discurso
afinal, a psicanálise postula o ser humano como um ser linguageiro e, são os agentes que circulam a criança que irão
configurar-se como figuras humanizadoras para mesma. Conforme Couto (2003, p.
57) observemos que “quando nos referimos à mãe, estamos remetendo não
necessariamente à mãe natural, mas à função materna”
A
leitura psicanalítica da constituição do sujeito tem como intuito demonstrar o
valor da família como uma instancia importante para a criança numa ordem
simbólica. As palavras que lhes são dirigidas são cheias de sentimentos dos
agentes que a circulam e, inaugura possíveis vias de simbolização e sentimento.
A família é então a entrada em contexto amplo e social, e é assim que, para
fins desse escrito, considera-se a família, de modo geral, nos moldes propostos
por Lacan, ou seja, como “sendo aquela na
qual configura-se não apenas um grupo natural, mas, simbólico”. (LACAN apud
DOR, 1992, p.17)
A partir de tais premissas vemos então a
importância simbólica da família na estruturação de uma criança e ainda a
importância do corpo visto que a criança pequena vivencia inicialmente o mundo
no corpo. Portanto
[...] o
reconhecimento do que compõe o estatuto do ato educativo e da relação educativa
– à luz de uma teoria freudiana da sedução – com o respaldo da ética
psicanalítica, aponta para necessidade de, no processo educativo, abrir espaço
para entrada da Lei do Pai, do terceiro, representados, nessa relação triádica,
pela Cultura, pelo conhecimento. (Couto, 2003, p. 120)
Isso ficará ainda mais demonstrado
quando a criança passa então a ter fraturas no processo de conhecimento. O seu
corpo, o seu movimento, a sua aprendizagem em algum momento podem apresentar-se
fracassados e eis que a análise do contexto no qual ela esta inserida é
remetida para que a compreensão deste sujeito se faça, pois o sujeito esta
inserido na instância simbólica sendo falado pelo grupo de pertença . A saber
Cukiert (2004), tratando sobre o corpo na tópica lacaniana e da sua relação com
o registro simbólico, nos esclarece que:
Tendo como referência o texto "Função
e Campo da Fala e da Linguagem em Psicanálise", publicado por Lacan em
1953, e sua concepção do primado da linguagem, é preciso levar em conta o corpo
marcado pelo Simbólico, suporte do significante, no qual as diversas partes
podem servir de significantes, isto é, ir além de sua função no corpo vivo.
CUKIERT (2004, 226-227)
Uma
criança, neste sentido, pode apresentar uma inapropriação do seu corpo de modo
que é torpe nos seus movimentos. Por ser considerada e falada pelo meio
familiar como aquela que é incapaz de pegar algo que “tudo cai das suas mãos”
ou ainda “vive caindo pelo caminho”, “não para”, “não aprende” é
“descoordenada”, passa a ter nestes termos a sua verdade de forma que estas
expressões a tornam uma desajeitada para o senso comum, mas, mais do que isso
ela vivencia um significante de incapacidade como sendo a sua imagem corporal através
da queixa-sintoma.
A
contribuição do olhar psicanalítico sob o sujeito neste caso se mostrará eficaz
quando o profissional conseguir acessar e compreender tal significante e
permitir que o sujeito o elabore de modo mais adequado passando a uma imagem
corporal diferente e, por conseguinte uma vivência corporal menos sintomática
dando outros significados à sua vida. Isso se dará dialeticamente através das
atitudes globais do sujeito. Sobre isso Fernández (1991, p. 59) contribui referindo
que “a apropriação das possibilidades de ação, instrumentada pelo corpo confere
um poder de síntese ao ser e ao saber do sujeito, assim como uma ressonância
agradável que o ajudará a incorporar a experiência”
Os
conhecimentos de conceitos relacionados ao corpo como o de imagem corporal
auxiliam desta maneira o professor a ter outro olhar sobre o aluno-sujeito, de
modo a ampliar e auxiliar com isso questões referentes à aprendizagem quando
demonstram que alguns casos de dificuldade não se circunscrevem apenas a
questões pedagógicas em si, mas, a questões psicomotoras. Por vezes, nas
questões levantadas pelo professor vem à tona uma imagem corporal desconexa de
modo que a atitude emocional frente ao seu próprio corpo naquele momento está
lhe permitindo simbolizar através de um sintoma escolar. Por outras vezes, uma
falta de domínio óculo-manual - que é fundamental de ser adquirido para que a
criança tenha um bom domínio da escrita - necessita ser trabalhado. Neste
sentido, percebamos quão importante é a interferência multirreferencial fazendo
com que o professor amplie sua leitura do cenário educativo contemporâneo.
Pensar a
escola torna inerente pensar também os processos e as relações que nela se
estabelecem e, assim, falamos de processo ensino-aprendizagem, relação
aluno-professor dentre tantas outras nomenclaturas. Trago então à baila a
discussão se a escola questiona o seu próprio funcionamento quanto às relações
estabelecidas do aluno com o processo de aprendizagem e o seu corpo. Ao
verificar na escola que uma criança apresenta comportamentos instáveis tendo
necessidade de estar em movimento durante todo o tempo, sendo desorganizada no
espaço e nas questões práticas, esta é uma das situações em que o professor
necessita do conhecimento teórico acerca de outras epistemes que apóiem sua
prática.
Por
vezes uma criança desorganizada apresenta um esquema psicomotor desorganizado.
Daí verificar a importância de um trabalho diferenciado com este aluno-sujeito permitirá
que seja redimensionada a sua falta de planejamento motor passando a usar seus
movimentos em relação ao outro, a si mesma e ao meio - a sua corporeidade -
como forma de melhorar essa sua relação Eu no Mundo. Sobre isso, Levin (2004,
p.47) refere “o corpo é tomado na linguagem pela mediação da letra. Portanto, o
corpo é “fonológico” e não falante por si mesmo. O que fala é o sujeito através
de seu corpo, das variações tônicos-motoras, do movimento dos gestos e do
esquema corporal”.
Certamente
a escuta sensível do professor aos fenômenos que perpassam a sala de aula lhe permite
uma acolhida destas demandas através de um olhar que possa contemplar e
alcançar a singularidade das existências, através da utilização do lúdico, do
jogo, da observação das falas, dos silêncios, dos gestos e do corpo, enfim, das
diferentes manifestações expressivas do sujeito trazidas ao profissional que
atua na escola. Avaliando como vão se construindo os caminhos traçados pelos
desejos humanos e seus quereres concernentes à aprendizagem, revela-se a
condição deste sujeito posicionar-se frente às suas questões sintomáticas. O
trabalho desenvolvido por um profissional que esteja aberto ao diálogo entre as
contribuições da psicanálise à educação irá se pautar na concepção da
subjetividade como constituída através dos vínculos com o outro e, permitirá um
olhar que enfatiza os artifícios internos, subjetivos e intrapsíquicos do
aprendente que neste caso encontra-se em “processo de construção do
conhecimento”. (SILVA, 1998, p.29)
PINCELADAS FINAIS: O CORPO NU
“O Corpo é o
lugar fantástico onde
mora, adormecido,
um universo inteiro.”
Rubem Alves
O trabalho
com o corpo durante a escolarização passa por períodos distintos. Consideramos de
um modo geral que se a apropriação deste corpo não se der adequadamente
poderemos encontrar dificuldades no futuro, pois a simbolização no corpo vai se
dando na medida em que o sujeito vai se constituindo enquanto tal. No processo
de escolarização da criança durante a Educação Infantil, por exemplo, a
necessidade de movimentar-se é mais respeitada pela escola, o corpo é usado em
brincadeiras, atividades de arte, de música etc. A criança pode correr, pular,
levantar-se sem censura alguma. Seguem-se inclusive as idéias de Piaget (1896-1980)
que trouxe a caracterização do desenvolvimento da criança através da divisão de
estágios e caracterizou de Período Sensório-motor de forma a considerar que
nesta etapa, a criança organiza as informações obtidas através dos órgãos dos
sentidos e desenvolve respostas aos estímulos ambientais, utilizando-se de um
comportamento adaptativo, porque ela está constantemente modificando os seus
esquemas de ação em resposta ao ambiente.
Entretanto a passagem para o Ensino Fundamental, quando
as crianças estão por volta de 6 ou 7 anos, mostra uma mudança brusca sendo ela
- a criança - chamada a ter outra postura: a de ser “mais séria”. Afinal de
contas, acredita-se que para a efetivação do processo de letramento é
necessário estar sentado em frente ao ‘mestre’ para dele ‘beber’ o
conhecimento. Mas será que se trata apenas de uma questão cronológica? Será que
há necessidade de olhar fixamente para o quadro para aprender ou, será que
vivenciar o aprendizado no corpo torna mais efetivo e mais satisfatório
aprendizado?
Estas
são questões a se pensar! Em entrevista[8]
à repórter Paola Gentile
da Revista Nova Escola o psicanalista Esteban Levin marca que “Os movimentos
são saberes que adquirimos sem saber, mas que também ficam à nossa disposição
para serem colocados em uso”. Nesta mesma entrevista, Levin pontua ainda que “a
obrigação de deixar o corpo estático, sem movimento, pode ser uma das causas da
hiperatividade, isso sem falar das dores corporais que a falta de atividade às
vezes traz”. Ratifico com isso a hipótese discutida na pesquisa de mestrado[9]
em andamento em que muitos casos encaminhados pela escola como falta de atenção
e concentração, ou ainda, ‘dificuldade de aprendizagem’ estão muito mais
associados a questões psicomotoras mal trabalhas e, até por que não, mal
administradas.
Sim,
digo mal administradas, pois percebo uma ansiedade atual quanto à criança
permanecer sentada chegando este aspecto a ser qualificado como avaliativo. Em
tempos de tecnologia e cibercultura
onde se fica sentado em frete à TV ou na internet, em chats, redes sociais ou em jogos eletrônicos durantes horas,
parece-me que isto faz esquecermos que criança por si é movimento, é corpo em
movimento como meio de absorção do mundo ao seu redor.
Suponho que uma forma de
minimizar tais encaminhamentos seria um trabalho planejado com a finalidade de
demonstrar ao professor que um bom uso do corpo pode ser de grande ajuda no
processo de aprender e apreender conteúdos. Aprender experimentando no corpo mostra-se
mais prazeroso do que sentados estáticos em frente ao “quadro-negro” afinal
assimilar palavras, conceitos, teorias e construtos é realizado por cada um de
modo distinto e, a padronização do ‘estar
sentado’ pode dificultar este processo para aqueles que têm modalidade de
aprendizagem sendo mais corporais do que verbais. Devemos enquanto
profissionais não perder de vista a possibilidade de pensar várias opções para
a criança adquirir conhecimento afinal, o uso do movimento corporal pode ser um
recurso prazeroso e, por conseguinte, eficiente no processo de ensino e de
aprendizagem que deve considerar os aspectos
físicos, afetivos, sociais e cognitivos.
Podemos
ainda pensar que uma das contribuições da psicanálise à escola é auxiliar
teoricamente a implementação de planos de ação onde o corpo fosse valorizado
enquanto peça importante na aquisição da aprendizagem de maneira que haja uma
valorização do aluno enquanto sujeito ativo no processo pedagógico saindo da
ideia de aluno como mero receptáculo de conhecimentos construídos socialmente. Para
que consiga propor tais intervenções e para que exista uma mudança de eixo na
visão do corpo e do ato motor é importante que o profissional conheça toda a
escola, sua estrutura institucional e que forme laços afetivos que sustentem o
trabalho visto que as relações profissionais são muito importantes neste
sentido.
A partir
do momento em que o profissional se aproxima das diversas instancias através do
conhecer ele vai legitimar sua posição dentro da escola, estrutura que agora
também fará parte, consolidando o seu trabalho. Terá que tomar cuidado para que
não haja superposição de papéis e nesta intervenção pautará sua ação vendo
também através da aproximação das instancias como esta escola se insere na
comunidade (sociedade) sem pressa de dar resultados destes processos, pois, é a
escuta detalhada e a interface destes contextos que irão compor o seu plano de
ação.
A
passagem do lugar de corpo pecaminoso à corpo legitimado ou seja, a ressignificação
da função do corpo, permite
que as lembranças do processo ensino-aprendizagem sejam prazerosas - como já
citado - e isso faz com que o sujeito associe o aprendizado a sensações
gostosas e encantadoras do brincar. O contato direto com os objetos e a
interação com o outro promovem brincadeiras que geram curiosidade, inquietação,
necessidade de movimentar-se e, no final, um aprendizado mais efetivo. Afinal
de contas compreender a aprendizagem apenas reduzida ao viés da patologia é um
reducionismo, pois o importante ao profissional na escola é verificar como o
sujeito aprende e porque este processo pode estar “atrapado”[10]
e não como ele não aprende pois isto está colocado pelos outros professores,
coordenadores e até familiares. Deste modo, vejo que a Psicanálise legitima o
corpo à escola mostrando que a relação corpo-aprendizagem é uma díade capital demonstrando
ainda ser de grande importância que os profissionais que atuam na área educacional
possam se apropriar melhor de como trabalhar para que o corpo seja um auxiliar
seu favor.
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[1]
Refiro-me, por exemplo, ao uso das palmatórias.
[2] Cf.
Morin, 2001.
[4] Cf. Jerusalinsky,
2006.
[5] Cf.
Sànchez, 2003.
[6] Cf.
Roudinesco, 1998, p. 714.
[7] A
tópica do RSI se modifica ao longo do pensamento de Lacan. Ela passou por duas
organizações sucessivas: "na primeira (1953-1970), o simbólico exerceu a
primazia sobre as outras duas instâncias (S.R.I.) e, na segunda (1970-1978), o
real é que foi colocado na posição dominante (R.S.I.)". (ROUDINESCO, 1998,
p. 755)
[8]
Disponível em: http://revistaescola.abril.com.br/educacao-fisica/pratica-pedagogica/esteban-levin-corpo-ajuda-aluno-aprender-423993.shtml
[9]
Pesquisa de Mestrado iniciada no ano de 2011, no momento em desenvolvimento na
Universidade do Estado da Bahia, no Programa de Pós Graduação em Educação e
Contemporaneidade sob o título provisório: A subjetivação do professor frente o
aluno com inibição no ato de aprender, tendo como orientadora a Profª Pós Drª
Maria de Lourdes S. Ornellas
[10] Termo
usado por Alicia Fernández - traduzido para o português como sendo aprisionado
- no livro Inteligência Aprisionada.
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