quinta-feira, 28 de maio de 2020

O CORPO QUE A PSICANÁLISE LEGITIMA À EDUCAÇÃO (2012)


O CORPO QUE A PSICANÁLISE LEGITIMA À EDUCAÇÃO

                                                     La magie noire (1945) - René Magritte



UMA PRIMEIRA PINCELADA

Inicio estas letras pensando como a pintura La magie noire (1945) do artista belga René François Ghislain Magritte (1898- 1967) de fato pode - dentre outras interpretações – representar a relação entre corpo, psicanálise e educação. Artista, que tem como foco de trabalho o uso de imagens insólitas, nesta obra específicamente me faz metaforizar o corpo na representação do nu sendo isso a validação dada pela psicanálise à educação. Explico melhor: por questões históricas a escola esteve sempre ligada à igreja e aos seus dogmas, por conta disso, jamais permitia pensar o corpo despido de vestes. Por considerar o humano ‘a imagem e semelhança de Deus’ a escola tomando por base os desígnos da igreja propaga entre os alunos-fiéis a necessidade da contenção do corpo. Este corpo que trago na imagem sedutor e nu, neste sentido, apesar de ser visto como um aliado de satanás - pois, quando os prazeres carnais desafiam as normas estabelecidas pela escola é exorcizado como que estivesse entregue aos domínios do mal - é a minha metáfora referindo a possibilidade que Psicanálise propõe de sair deste lugar proíbido e maléfico passando o corpo nu a ocupar um lugar legitimado.
 Quando refiro sobre a legitimação do corpo pela psicanálise à educação, penso ainda que as nuvens que perpasam este corpo representado por Magritte podem tomar diversas formas a depender do ponto de vista e podem representar com isso as diversas possibilidades de uso do corpo à favor dos processos educacionais especialmente dos processos referentes a díade ensino-aprendizagem.
Nas últimas décadas vemos avançar discussões sobre o corpo. As mesmas tem sido alvo de debates e produções nos campos das ciências humanas e da filosofia, entretanto, no campo da educação o tema ainda mostra certa timidez de abordagem. Se pensarmos sobre os primórdios da profissão docente veremos que esta não nasce do professor como acontece em outras profissões liberais que se constituem endogenamente e lutam para se individualizar. Ela – a docência – nasce da igreja e se configura como ofício tendo na ideia de sacerdócio e aptidão o seu cerne assim, sendo considerado um movimento exógeno. Neste sentido, o olhar religioso sobre educação não permitia vislumbrar o corpo na possibilidade do mesmo ser usado a favor da aprendizagem. Ao contrário o corpo, através dos castigos físicos[1], era usado como punição a não aprendizagem ou ao possível descumprimento das regras internas da sala de aula.  Amarra-se o corpo deixando livre apenas o cérebro considerando que desta maneira se daria de fato o processo de aprendizagem.
Somente no século XIX a escola normal vai se constituir acontecendo aí o início da formalização da formação passando de certa maneira, a escola, de leiga a laica sendo convocada a afastar-se das premissas religiosas acedendo a lugar imparcial, neste sentido ficando inclusive sua organização a cargo do Estado, aí se instaurando o lugar social da escola. Ou seja, é na modernidade que nascerá no seio do movimento social o modelo de escola o qual trará à criança possibilidade outra que apenas a de “coexistência cotidiana com o mundo dos adultos” (NÓVOA, 1991, p. 110) transpondo a aprendizagem de condutas e de saberes da família e das comunidades a este novo modelo de escola que passa a tomar o corpo sob outra dimensão. Este passa a ser visto como importante ao processo de aprendizagem já que os construtos da psicomotricidade surgem para colaborar com esta articulação corpo-aprendizagem de maneira que agora há um maior entendimento do sujeito na articulação entre: aprendizagem, desejo, cognição e corpo. 
A escola do lugar de instituição social[2] passa a ter uma relação dialética com a sociedade. Este “caminho entre as ideias”[3] permite que pensemos sobre a mesma como espaço de transformação ainda que traga marcas da cultura do sistema dominante capitalista. Os avanços da ciência fizeram com que o conhecimento se torne fragmentado, paralelo a isso produziu-se também desconhecimento do humano da vida e das relações e, o reflexo disso na educação perpassa pelos sistemas competitivos e pelos saberes desconectados. Percebemos que apesar desta nova perspectiva que se coloca a relação do professor com o processo de aprendizagem do seu aluno ainda é algo permeado de inseguranças que muitas vezes refletem a sua formação.
Conforme nos traz Nóvoa (2002, p.33) “a planificação baseada em diagnósticos cada vez mais sofisticados das situações educativas assumiu-se como ponto nodal da ação pedagógica”. De modo geral a formação do professor tornou-se um campo cheio de desafios para que possa se adequar às exigências dos novos contextos contemporâneos tais quais: a globalização das economias, as novas tecnologias, os novos modos virtuais de comunicação, dentre outros e o corpo é uma temática pouco vista nos currículos, nas atividades e nas disciplinas da pedagogia.

A PINTURA DA TELA: A PSICANÁLISE LEGITIMA O CORPO À EDUCAÇÃO

“Nascendo na chamada era vitoriana, num suposto berço repressivo, a Psicanálise surge diluindo as fronteiras entre o corpo e a alma, entre o normal e o patológico, entre o esporádico e o cotidiano, entre a inocência e a perversão, tornando-se, dessa forma, um bebê escandaloso”

Maria Joana de Brito D’Elboux Couto

De modo geral podemos considerar que o corpo e os gestos são fundamentais para a formação global do ser humano. Desde que nasce, podemos perceber que a criança usa a linguagem corporal para conhecer a si mesma, para relacionar-se com seus pais, para movimentar-se e descobrir o mundo[4] o movimento constitui desta maneira a sua expressão global de necessidades. Essas descobertas feitas com o corpo deixam marcas, são aprendizados incorporados e eficazes[5], que lhe dão acesso a ordem da cultura, além de auxiliar na formação do mundo simbólico deste sujeito.
Sobre o simbólico esclareço que o termo foi utilizado em 1936 pelo Psicanalista Jacques Lacan quando tecia comentários sobre o estádio do espelho[6]. Tomado de empréstimo do psicólogo Henri Wallon (1879-1962), Lacan conceituou de fato ‘simbólico’ em 1953 quando escreveu sobre a trilogia do RSI[7] (Real, Simbólico e Imaginário). Nesta categoria Lacan introduziu uma reformulação baseada em Leví-Strauss de modo que o inconsciente freudiano foi redimensionado “como lugar de uma mediação comparável à do significante no registro da língua” (ROUDINESCO, 1998, p. 714).
Assim, simbólico passa a ser utilizado
para designar um sistema de representação baseado na linguagem, isto é, em signos e significações que determinam o sujeito à sua revelia, permitindo-lhe referir-se a ele, consciente e inconscientemente, ao exercer sua faculdade de simbolização. (ROUDINESCO, 1998, p. 714)

Para que o sujeito seja constituído de modo efetivo e psiquicamente saudável, neste sentido sob o prisma da psicanálise que aqui tomo como balizador, é necessário que a sua constituição se dê dentro da base triangular. A triangulação edipiana formada por pai – mãe – criança inaugura um mundo simbólico sustentado pela lei exercida pela função paterna, o pai fazendo parte do mito necessário à ordem (Lei) e, essa suposição torna-se universal e paira no imaginário coletivo.
A esse respeito, Dor (1992, p.17) trazendo as ideias de Lacan defende a importância do pai, não enquanto ser encarnado, mas como ‘entidade essencialmente simbólica’ que ordena uma função. Nesse sentido, a questão do pai é postulada sob a égide da triangulação edipiana como unidade fundadora da família. Com isso, busca-se marcar a importância das funções parentais e do seu papel simbólico enquanto um sistema ordenador do sujeito e suporte da estruturação psíquica da criança, permitindo-lhe iniciar-se em uma existência significante.
Assim, a família não se constitui apenas de homem, mulher e filhos, ela é antes construção psíquica, onde cada membro tem sua função e seu lugar constituindo-se num verdadeiro sistema cuja marca desempenha papel fundamental no nascimento do sujeito, em sua inscrição subjetiva. Vale salientar que apesar de Lacan tratar da teoria ele não exclui o corpo no seu esquema topológico nem reduz o fenômeno analítico apenas ao simbólico, ou seja ele não reduz o sujeito apenas a discurso.
Importante de pontuar com isso que cabe a mãe sustentar o pai através do seu discurso afinal, a psicanálise postula o ser humano como um ser linguageiro e, são os agentes que circulam a criança que irão configurar-se como figuras humanizadoras para mesma. Conforme Couto (2003, p. 57) observemos que “quando nos referimos à mãe, estamos remetendo não necessariamente à mãe natural, mas à função materna”
A leitura psicanalítica da constituição do sujeito tem como intuito demonstrar o valor da família como uma instancia importante para a criança numa ordem simbólica. As palavras que lhes são dirigidas são cheias de sentimentos dos agentes que a circulam e, inaugura possíveis vias de simbolização e sentimento. A família é então a entrada em contexto amplo e social, e é assim que, para fins desse escrito, considera-se a família, de modo geral, nos moldes propostos por Lacan, ou seja, como “sendo aquela na qual configura-se não apenas um grupo natural, mas, simbólico”. (LACAN apud DOR, 1992, p.17)
 A partir de tais premissas vemos então a importância simbólica da família na estruturação de uma criança e ainda a importância do corpo visto que a criança pequena vivencia inicialmente o mundo no corpo. Portanto
[...] o reconhecimento do que compõe o estatuto do ato educativo e da relação educativa – à luz de uma teoria freudiana da sedução – com o respaldo da ética psicanalítica, aponta para necessidade de, no processo educativo, abrir espaço para entrada da Lei do Pai, do terceiro, representados, nessa relação triádica, pela Cultura, pelo conhecimento. (Couto, 2003, p. 120)

Isso ficará ainda mais demonstrado quando a criança passa então a ter fraturas no processo de conhecimento. O seu corpo, o seu movimento, a sua aprendizagem em algum momento podem apresentar-se fracassados e eis que a análise do contexto no qual ela esta inserida é remetida para que a compreensão deste sujeito se faça, pois o sujeito esta inserido na instância simbólica sendo falado pelo grupo de pertença . A saber Cukiert (2004), tratando sobre o corpo na tópica lacaniana e da sua relação com o registro simbólico, nos esclarece que:
Tendo como referência o texto "Função e Campo da Fala e da Linguagem em Psicanálise", publicado por Lacan em 1953, e sua concepção do primado da linguagem, é preciso levar em conta o corpo marcado pelo Simbólico, suporte do significante, no qual as diversas partes podem servir de significantes, isto é, ir além de sua função no corpo vivo. CUKIERT (2004, 226-227)
Uma criança, neste sentido, pode apresentar uma inapropriação do seu corpo de modo que é torpe nos seus movimentos. Por ser considerada e falada pelo meio familiar como aquela que é incapaz de pegar algo que “tudo cai das suas mãos” ou ainda “vive caindo pelo caminho”, “não para”, “não aprende” é “descoordenada”, passa a ter nestes termos a sua verdade de forma que estas expressões a tornam uma desajeitada para o senso comum, mas, mais do que isso ela vivencia um significante de incapacidade como sendo a sua imagem corporal através da queixa-sintoma.
A contribuição do olhar psicanalítico sob o sujeito neste caso se mostrará eficaz quando o profissional conseguir acessar e compreender tal significante e permitir que o sujeito o elabore de modo mais adequado passando a uma imagem corporal diferente e, por conseguinte uma vivência corporal menos sintomática dando outros significados à sua vida. Isso se dará dialeticamente através das atitudes globais do sujeito. Sobre isso Fernández (1991, p. 59) contribui referindo que “a apropriação das possibilidades de ação, instrumentada pelo corpo confere um poder de síntese ao ser e ao saber do sujeito, assim como uma ressonância agradável que o ajudará a incorporar a experiência”
Os conhecimentos de conceitos relacionados ao corpo como o de imagem corporal auxiliam desta maneira o professor a ter outro olhar sobre o aluno-sujeito, de modo a ampliar e auxiliar com isso questões referentes à aprendizagem quando demonstram que alguns casos de dificuldade não se circunscrevem apenas a questões pedagógicas em si, mas, a questões psicomotoras. Por vezes, nas questões levantadas pelo professor vem à tona uma imagem corporal desconexa de modo que a atitude emocional frente ao seu próprio corpo naquele momento está lhe permitindo simbolizar através de um sintoma escolar. Por outras vezes, uma falta de domínio óculo-manual - que é fundamental de ser adquirido para que a criança tenha um bom domínio da escrita - necessita ser trabalhado. Neste sentido, percebamos quão importante é a interferência multirreferencial fazendo com que o professor amplie sua leitura do cenário educativo contemporâneo.
Pensar a escola torna inerente pensar também os processos e as relações que nela se estabelecem e, assim, falamos de processo ensino-aprendizagem, relação aluno-professor dentre tantas outras nomenclaturas. Trago então à baila a discussão se a escola questiona o seu próprio funcionamento quanto às relações estabelecidas do aluno com o processo de aprendizagem e o seu corpo. Ao verificar na escola que uma criança apresenta comportamentos instáveis tendo necessidade de estar em movimento durante todo o tempo, sendo desorganizada no espaço e nas questões práticas, esta é uma das situações em que o professor necessita do conhecimento teórico acerca de outras epistemes que apóiem sua prática.
Por vezes uma criança desorganizada apresenta um esquema psicomotor desorganizado. Daí verificar a importância de um trabalho diferenciado com este aluno-sujeito permitirá que seja redimensionada a sua falta de planejamento motor passando a usar seus movimentos em relação ao outro, a si mesma e ao meio - a sua corporeidade - como forma de melhorar essa sua relação Eu no Mundo. Sobre isso, Levin (2004, p.47) refere “o corpo é tomado na linguagem pela mediação da letra. Portanto, o corpo é “fonológico” e não falante por si mesmo. O que fala é o sujeito através de seu corpo, das variações tônicos-motoras, do movimento dos gestos e do esquema corporal”.
Certamente a escuta sensível do professor aos fenômenos que perpassam a sala de aula lhe permite uma acolhida destas demandas através de um olhar que possa contemplar e alcançar a singularidade das existências, através da utilização do lúdico, do jogo, da observação das falas, dos silêncios, dos gestos e do corpo, enfim, das diferentes manifestações expressivas do sujeito trazidas ao profissional que atua na escola. Avaliando como vão se construindo os caminhos traçados pelos desejos humanos e seus quereres concernentes à aprendizagem, revela-se a condição deste sujeito posicionar-se frente às suas questões sintomáticas. O trabalho desenvolvido por um profissional que esteja aberto ao diálogo entre as contribuições da psicanálise à educação irá se pautar na concepção da subjetividade como constituída através dos vínculos com o outro e, permitirá um olhar que enfatiza os artifícios internos, subjetivos e intrapsíquicos do aprendente que neste caso encontra-se em “processo de construção do conhecimento”. (SILVA, 1998, p.29)

PINCELADAS FINAIS: O CORPO NU

“O Corpo é o lugar fantástico onde
mora, adormecido, um universo inteiro.”
Rubem Alves

O trabalho com o corpo durante a escolarização passa por períodos distintos. Consideramos de um modo geral que se a apropriação deste corpo não se der adequadamente poderemos encontrar dificuldades no futuro, pois a simbolização no corpo vai se dando na medida em que o sujeito vai se constituindo enquanto tal. No processo de escolarização da criança durante a Educação Infantil, por exemplo, a necessidade de movimentar-se é mais respeitada pela escola, o corpo é usado em brincadeiras, atividades de arte, de música etc. A criança pode correr, pular, levantar-se sem censura alguma. Seguem-se inclusive as idéias de Piaget (1896-1980) que trouxe a caracterização do desenvolvimento da criança através da divisão de estágios e caracterizou de Período Sensório-motor de forma a considerar que nesta etapa, a criança organiza as informações obtidas através dos órgãos dos sentidos e desenvolve respostas aos estímulos ambientais, utilizando-se de um comportamento adaptativo, porque ela está constantemente modificando os seus esquemas de ação em resposta ao ambiente.
Entretanto a passagem para o Ensino Fundamental, quando as crianças estão por volta de 6 ou 7 anos, mostra uma mudança brusca sendo ela - a criança - chamada a ter outra postura: a de ser “mais séria”. Afinal de contas, acredita-se que para a efetivação do processo de letramento é necessário estar sentado em frente ao ‘mestre’ para dele ‘beber’ o conhecimento. Mas será que se trata apenas de uma questão cronológica? Será que há necessidade de olhar fixamente para o quadro para aprender ou, será que vivenciar o aprendizado no corpo torna mais efetivo e mais satisfatório aprendizado?
Estas são questões a se pensar! Em entrevista[8] à repórter Paola Gentile da Revista Nova Escola o psicanalista Esteban Levin marca que “Os movimentos são saberes que adquirimos sem saber, mas que também ficam à nossa disposição para serem colocados em uso”. Nesta mesma entrevista, Levin pontua ainda que “a obrigação de deixar o corpo estático, sem movimento, pode ser uma das causas da hiperatividade, isso sem falar das dores corporais que a falta de atividade às vezes traz”. Ratifico com isso a hipótese discutida na pesquisa de mestrado[9] em andamento em que muitos casos encaminhados pela escola como falta de atenção e concentração, ou ainda, ‘dificuldade de aprendizagem’ estão muito mais associados a questões psicomotoras mal trabalhas e, até por que não, mal administradas.
Sim, digo mal administradas, pois percebo uma ansiedade atual quanto à criança permanecer sentada chegando este aspecto a ser qualificado como avaliativo. Em tempos de tecnologia e cibercultura onde se fica sentado em frete à TV ou na internet, em chats, redes sociais ou em jogos eletrônicos durantes horas, parece-me que isto faz esquecermos que criança por si é movimento, é corpo em movimento como meio de absorção do mundo ao seu redor.
Suponho que uma forma de minimizar tais encaminhamentos seria um trabalho planejado com a finalidade de demonstrar ao professor que um bom uso do corpo pode ser de grande ajuda no processo de aprender e apreender conteúdos. Aprender experimentando no corpo mostra-se mais prazeroso do que sentados estáticos em frente ao “quadro-negro” afinal assimilar palavras, conceitos, teorias e construtos é realizado por cada um de modo distinto e, a padronização do ‘estar sentado’ pode dificultar este processo para aqueles que têm modalidade de aprendizagem sendo mais corporais do que verbais. Devemos enquanto profissionais não perder de vista a possibilidade de pensar várias opções para a criança adquirir conhecimento afinal, o uso do movimento corporal pode ser um recurso prazeroso e, por conseguinte, eficiente no processo de ensino e de aprendizagem que deve considerar os aspectos físicos, afetivos, sociais e cognitivos.
Podemos ainda pensar que uma das contribuições da psicanálise à escola é auxiliar teoricamente a implementação de planos de ação onde o corpo fosse valorizado enquanto peça importante na aquisição da aprendizagem de maneira que haja uma valorização do aluno enquanto sujeito ativo no processo pedagógico saindo da ideia de aluno como mero receptáculo de conhecimentos construídos socialmente. Para que consiga propor tais intervenções e para que exista uma mudança de eixo na visão do corpo e do ato motor é importante que o profissional conheça toda a escola, sua estrutura institucional e que forme laços afetivos que sustentem o trabalho visto que as relações profissionais são muito importantes neste sentido.
A partir do momento em que o profissional se aproxima das diversas instancias através do conhecer ele vai legitimar sua posição dentro da escola, estrutura que agora também fará parte, consolidando o seu trabalho. Terá que tomar cuidado para que não haja superposição de papéis e nesta intervenção pautará sua ação vendo também através da aproximação das instancias como esta escola se insere na comunidade (sociedade) sem pressa de dar resultados destes processos, pois, é a escuta detalhada e a interface destes contextos que irão compor o seu plano de ação.
A passagem do lugar de corpo pecaminoso à corpo legitimado ou seja, a ressignificação da função do corpo, permite que as lembranças do processo ensino-aprendizagem sejam prazerosas - como já citado - e isso faz com que o sujeito associe o aprendizado a sensações gostosas e encantadoras do brincar. O contato direto com os objetos e a interação com o outro promovem brincadeiras que geram curiosidade, inquietação, necessidade de movimentar-se e, no final, um aprendizado mais efetivo. Afinal de contas compreender a aprendizagem apenas reduzida ao viés da patologia é um reducionismo, pois o importante ao profissional na escola é verificar como o sujeito aprende e porque este processo pode estar “atrapado”[10] e não como ele não aprende pois isto está colocado pelos outros professores, coordenadores e até familiares. Deste modo, vejo que a Psicanálise legitima o corpo à escola mostrando que a relação corpo-aprendizagem é uma díade capital demonstrando ainda ser de grande importância que os profissionais que atuam na área educacional possam se apropriar melhor de como trabalhar para que o corpo seja um auxiliar seu favor. 
 REFERÊNCIAS
COUTO, Maria Joana de Brito D’Elboux. Psicanálise e Educação: a sedução e a tarefa de educar. São Paulo: Avercamp, 2003.
CUKIERT, Michele. Considerações sobre corpo e linguagem na clínica e na teoria lacaniana. São Paulo: Revista de Psicologia USP, v. 15, numero 1/2, p. 225-241, jun. 2004.
DOR, Joel. Introdução à leitura de Lacan: o inconsciente estruturado como linguagem, Porto Alegra: Artes Médicas, 1992.
_______. Introdução: a função do pai em psicanálise. In: O pai e sua função em psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1991.
FERNÁNDEZ, Alícia. Lugar do corpo no aprender. In: Inteligência aprisionada. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991.
INGUAGGIATO, Maria Luiza. Função paterna e desenvolvimento psicomotor. Revista Iberoamericana de Psicomotricidad y Técnicas Corporales. Ano 1, nº 4, nov/2001.
JERUSALINSKY, Julieta. Temporalidade e desenvolvimento. In: Enquanto o futuro não vem – a psicanálise na clínica interdisciplinar com bebês. Salvador: Ágalma, 2006.
LEVIN, Esteban. Reflexões a propósito da clínica psicopedagógica e psicomotora. In: Jerusalinsky, Alfredo (org) Psicanálise e desenvolvimento infantil: um enfoque transdisciplinar. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 1999.
______. O corpo e o outro. In: A clínica psicomotora. Petrópolis: Vozes, 2004.
MORIN, Edgard. Os sete saberes necessários à Educação do Futuro. Brasília: Unesco, 2001
NÓVOA, Antonio. A formação contínua entre a pessoa-professor e a organização escola. In: Formação de professores e trabalho pedagógico. Lisboa: Educa, 2002. 
______. Para o estudo sócio-histórico da gênese e desenvolvimento da profissão docente. Teoria e Educação, Porto Alegre, Pannonica, nº 4, pp. 109/139, 1991.
ROUDINESCO, Elizabeth e PLON, Michel. Dicionário de Psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.
SÀNCHEZ, Pilar Arnaiz. A psicomotricidade: uma prática pedagógica de ajuda à maturação. In: A psicomotricidade na educação infantil: uma prática preventiva e educativa. Porto Alegre: Artmed, 2003.
SILVA, Maria Cecília Almeida e. Psicopedagogia: em busca de uma fundamentação teórica. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998.



[1] Refiro-me, por exemplo, ao uso das palmatórias.
[2] Cf. Morin, 2001.
[3] Tradução literal de dialética.
[4] Cf. Jerusalinsky, 2006.
[5] Cf. Sànchez, 2003.
[6] Cf. Roudinesco, 1998, p. 714.
[7] A tópica do RSI se modifica ao longo do pensamento de Lacan. Ela passou por duas organizações sucessivas: "na primeira (1953-1970), o simbólico exerceu a primazia sobre as outras duas instâncias (S.R.I.) e, na segunda (1970-1978), o real é que foi colocado na posição dominante (R.S.I.)". (ROUDINESCO, 1998, p. 755)
[8] Disponível em: http://revistaescola.abril.com.br/educacao-fisica/pratica-pedagogica/esteban-levin-corpo-ajuda-aluno-aprender-423993.shtml
[9] Pesquisa de Mestrado iniciada no ano de 2011, no momento em desenvolvimento na Universidade do Estado da Bahia, no Programa de Pós Graduação em Educação e Contemporaneidade sob o título provisório: A subjetivação do professor frente o aluno com inibição no ato de aprender, tendo como orientadora a Profª Pós Drª Maria de Lourdes S. Ornellas
[10] Termo usado por Alicia Fernández - traduzido para o português como sendo aprisionado - no livro Inteligência Aprisionada.

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