segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Psicanálise e Educação: (im)passes subjetivos contemporâneos

 
PSICANÁLISE E EDUCAÇÃO:
(im)passes subjetivos contemporâneos 
 Quarteto Editora


Oiê!!!!
 
Bem, quando falamos da interface Psicanálise e Educação percebemos uma grande quantidade de publicações ... Na escrita da dissertação busquei fazer uma garimpagem sobre o tema e adquiri muitas obras ... Assim, a cada tempo apresentarei uma delas!!!
 
Hoje destaco não uma obra qualquer mas, um livro do qual fiz parte através da escritura de um artigo à quatro mãos com Leide Antonino intitulado:
 
O ato da escuta: um estilo da psicanálise para educação 

         No texto, indicamos a escuta como uma das condições humanas que permite que duas pessoas entrem em contato, uma com a ideia da outra, devendo, assim, dar-se de maneira atenta para que o conteúdo possa ser internalizado e não apenas ouvido.
"O objetivo dela é o de equilibrar a crise de autoridade em que se debate a sociedade atual. Ou seja, consideramos que estamos propondo aqui um novo estilo[1] da psicanálise para a educação. Uma maneira especial de fazer essa aproximação, uma possibilidade de encontro entre os dois campos, de modo a estabelecer uma singularidade de ação.
Atualmente, as queixas que aparecem, advindas do meio pedagógico, circulam em torno de temáticas como a falta de limites das crianças, a falta de referências para os adolescentes, ausência de projetos da juventude e, com isso, a insegurança por parte de alguns educadores quanto aos princípios norteadores para compreender tais fenômenos. O ambiente escolar encontra-se, assim, em um mal-estar,[2] e a escuta, sobre o que estamos aqui versando, poderá ser um caminho de fazer uma leitura subjetiva[3].
Nesta perspectiva, o ato de escutar conceberá a subjetividade de cada um na relação com o outro e ainda com Outros, enfatizando os componentes internos, subjetivos e intrapsíquicos que, no caso específico da interface com a pedagogia, podemos considerar. Lembremos que os sujeitos aos quais estamos nos referindo são sujeitos em “processo de construção do conhecimento”, portanto seres cognoscentes [4].
A escuta vem, neste contexto, mostrar-se instrumento de junção das duas faces que encaminham e direcionam a construção subjetiva do sujeito: a educação e a psicanálise; parceiras e enamoradas é possível a aproximação destas duas, embora seu casamento não aconteça[5]. É nesta intercorrência e recorrência de afetos que as faltas se presentificam e assombram, passeando pelo prazer e pelo desprazer, algumas vezes fundindo-se, como percebeu Lacan (1985), numa ambivalência de sentimentos que possibilita o amódio.
A escuta como contribuição da psicanálise na educação...
... não obstante, deverá se dar nas entrelinhas trazidas pelo discurso, não sendo esta apenas reduzida às palavras ditas, mas também a atitudes e gestos que poderão advir na intervenção. Claro que não se trata aqui da “escuta analítica” - prerrogativa do psicanalista – mas já não passa despercebido este valor. Assim, a contribuição torna-se possível, a partir do momento em que a escuta surge como estatuto metodológico, reconhecido através da obra freudiana.
No caso da interface aqui proposta da psicanálise com a educação, poderá esta ser utilizada, por exemplo, verificando-se que situações afetivas conflituosas possam estar sendo o verdadeiro cerne do problema real que se instala no plano do aprendizado. Neste sentido, deverão ser procedidas as intervenções pertinentes e os encaminhamentos necessários. Vale ressaltar, nestes termos, que quando os problemas concernentes à ordem da aprendizagem chegam à clinica para serem tratados por profissionais clínicos é porque estes, os problemas em si, já estão cristalizados como sintoma e outras possibilidades já se esgotaram. Sobre isso Kupfer ressalta:
 
[...] o limite da intervenção, na escuta pedagógica, se dá no domínio estrito da pedagogia, cabendo o encaminhamento terapêutico, de caráter clínico, fora da escola, quando as medidas pedagógicas se mostrarem insuficientes pra determinar mudanças, e para que outros sintomas agregados à resposta sintomática de fracasso possam ser tratadas. (Kupfer apud SOARES, J. (2004), p. 202) 
Assim sendo, cabe ao profissional comprometido com o sujeito, sob o prisma do viés psicanalítico, acolher o sofrimento humano onde quer que se apresente, neste caso, na pedagogia, sob a forma de inibições de aprendizagem e outros, e viver com este uma relação concebida como reveladora e formadora de sentido, a qual expressa e desvela o modo de ser no mundo. Para isso, é necessário estar existencialmente disponível e, de certa forma, instrumentalizado para estabelecer esse tipo de relação com o outro através da extensão da escuta a outros meios, “[...]isso amplia o campo de ação do psicanalista, que passa a incluir a instituição escolar como lugar de escuta”[6].
Deveremos sempre, como profissionais que atuam na interface psicanálise e educação, conceber a subjetividade como constituída, através dos laços com o outro, ainda constatando a prevalência do olhar que enfatiza os processos internos, subjetivos e intrapsíquicos. Tal fato nos permite salientar que o olhar psicanalítico e a escuta trazida por esta perspectiva tem por objetivo não a classificação do sujeito em disléxico, distraído, discalcúlico, hipercinético e tantos outros rótulos que encontramos por aí, mas, sim, verificar como o sujeito está aprendendo e o que está dificultando o desenvolvimento de suas potencialidades. Temos que deixar de ‘medicalizar’ ou ‘psicologizar’ o aprender. Só assim poderemos intervir de maneira adequada, não visando a aspectos negativos da não-aprendizagem.
Ainda percebemos como é importante que a escuta na educação não surja apenas como forma de responder à angústia parental por querer dar um nome às manifestações sintomáticas dos filhos para se eximirem de qualquer sentimento de culpa pela falta de tempo, por exemplo, por conta da árdua jornada de trabalho. Em primeiro lugar, por conta do fato de que pais angustiados em nada ajudam seus filhos na superação de dificuldades ou na identificação do porquê de tais dificuldades; em segundo, porque um profissional, com a inspiração analítica, não poderá fazer parte da trupe de profissionais e de saberes que se prestam a efetuar uma intervenção que se assemelha a uma assistência técnica, tendo deste modo um cuidado redobrado na sua atuação, respeitando a multidimensionalidade humana das formas de elaborar as interações com o mundo, com os outros e com o saber. Afinal, o aluno não aprende somente com a dimensão cognitiva que o constitui, mas também com a dimensão do desejo. O sujeito reage de acordo com o modo como ele está estruturado psiquicamente.
Por fim, à guisa de uma conclusão, consideramos o ato de escutar um estilo da psicanálise para educação de maneira que há, sim, uma possibilidade de aproximação entre ambas. O ato de escutar se faz, enquanto discurso e ética e, certamente, se opõe a qualquer solução de adaptação do sujeito à cultura, pois modelos e padrões são a própria rejeição de estilo. Neste sentido, afastando-se os rótulos, acreditamos que o ato de escutar fará do sujeito um ser que suporte a realização do seu desejo, confrontando-se com a falta que o fará lembrar-se da sua condição humana".
REFERÊNCIAS
FERREIRA, A. B. H. Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1977.
FREUD. S. Além do princípio do prazer. In: Obras completas de Sigmund Freud. Rio de janeiro: Imago, 1996.
FREUD. S. Esboço de psicanálise. In: Obras completas de Sigmund Freud. Rio de janeiro: Imago, 1996.
FREUD. S. O futuro de uma ilusão. In: Obras completas de Sigmund Freud. Rio de janeiro: Imago, 1996.
FOUCAULT, M. A ordem do discurso. São Paulo: Edições Loyola, 2002.
KUPFER, M. C. Freud e a educação: o mestre do impossível. São Paulo: Editora Scipione, 2004.
______. Educação para o futuro: psicanálise e educação. São Paulo: Escuta, 2007.
LACAN. J. Seminário 11 – Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1990.
______. Seminário 20 - Mais Ainda. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985.
LAPLANCHE E PONTALIS. Vocabulário de Psicanálise. São Paulo: Martins Fontes, 2004.
NICK, E. e CABRAL, A. Dicionário de psicologia. São Paulo: Cultrix, 1997.
ORNELLAS, M.L.S. Afetos manifestos na sala de aula. São Paulo: Annablume, 2009.
______. Estilo: marca que obtura a falta do outro. Texto apresentado no II Colóquio Estadual de Educação, UNEB. CD ROM.
SILVA, M.C.A e. Psicopedagogia: em busca de uma fundamentação teórica. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1998.
SOARES, J. Psicanálise e Educação: novas aproximações num tempo de mutações. Revista da Faced, n° 08, 2004, p. 195 – 207.


 
[2]  ORNELLAS, M.L.S. (2009). Afetos manifestos na sala de aula, p. 57
[3]  Idem. Ibid.
[4] Ser cognoscente – termo utilizado por SILVA, M.C.A e. (1998). In: Psicopedagogia: em busca de uma fundamentação teórica. p. 29.
[5] Idem. Ibid.
[6]  KUPFER, M. C. Educação para o futuro: psicanálise e educação, p.34

 

 


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